Iker Casillas
Um ano depois de sofrer um enfarte agudo do miocárdio, Iker Casillas avalia a sua experiência na CUF e confirma que se mantém de boa saúde.
“O dia começou como outro qualquer”, recorda Iker Casillas. “Fui treinar ao Olival, o centro de estágios do FC Porto, e tudo corria normalmente. Até que, passados 30 ou 40 minutos, senti uma espécie de falta de ar, uma necessidade de respirar. Depois comecei a sentir-me doente e a perder um pouco o conhecimento.” É desta forma que o guarda-redes internacional, e um dos atletas mais populares e respeitados do mundo nas últimas décadas, recorda a manhã do dia 1 de maio de 2019 quando, sem nada que o fizesse prever, sofreu um enfarte agudo do miocárdio.
Nos primeiros instantes, o atleta não se apercebeu da gravidade do que lhe estava a acontecer. “Tenho propensão para alergias, era maio, estava calor e, mesmo a caminho do hospital, quando senti um aperto no peito, julguei que fosse alguma reação alérgica ou talvez algo que me tivesse caído mal.” Não era o caso. Felizmente, o problema foi detetado atempadamente pela equipa técnica do seu clube. O fisioterapeuta que acompanhava o treino chamou de imediato Nélson Puga, médico do FC Porto, e Iker Casillas foi rapidamente levado para o Hospital CUF Porto. “Tive muita sorte. Desde o Olival à CUF demorámos apenas uns 15 minutos”, conta o guarda-redes.
À chegada à unidade hospitalar, Iker Casillas tinha à sua espera, no Centro do Coração, uma equipa preparada para o receber liderada pelo cardiologista Filipe Macedo.
Seguiu-se a realização de um cateterismo cardíaco e de uma angioplastia. “Lembro-me de uma médica falar comigo e me dizer que tínhamos de fazer um cateterismo. Fiquei um pouco assustado. No entanto, desde o momento em que caí no treino até que entrei na sala de operações não se passaram mais do que 45 minutos”, garante Iker Casillas.
A rapidez no socorro e na realização do cateterismo foram determinantes, explica Filipe Macedo, Coordenador do Centro do Coração CUF Porto e o cardiologista que acompanha Iker Casillas. “De uma forma geral, o tempo corresponde à deterioração do músculo cardíaco. Quanto mais rápida for a intervenção desde o início dos sintomas até ao início do cateterismo e consequente angioplastia [abertura da artéria], melhor será o desfecho da situação aguda.” O médico acrescenta: “Neste caso conseguiu-se, de uma forma muito organizada, efetuar todo o procedimento dentro da janela terapêutica ideal. O processo completo não demorou sequer 90 minutos. Este tempo contribuiu para o excelente resultado obtido.”
Para Filipe Macedo, embora não sejam inéditos, casos como os de Iker Casillas são pouco comuns. “De uma maneira geral, as pessoas que têm maior predisposição para acidente agudo das coronárias são pessoas com múltiplos fatores de risco cardiovasculares, mais idosas ou com história familiar de doença das coronárias”, explica o médico. “Não se pode dizer que não surjam situações isquémicas agudas nos grupos etários jovens, mas habitualmente são pessoas com um perfil muito diferente do Iker Casillas, daí este caso ser pouco comum.”
Nova vida, novos treinos
Foi já após a alta que Iker Casillas se consciencializou enfim do que lhe tinha sucedido. “No hospital toda a gente me tratou de forma fenomenal. Sentia-me protegido e podia sempre chamar alguém. Mas quando fui para casa fiquei um pouco mais nervoso”, admite o atleta, que estranhou o descanso a que se viu obrigado nas primeiras semanas. “O Prof. Filipe Macedo disse-me que durante as duas primeiras semanas tinha de permanecer muito sossegado e que, se saísse à rua, que fosse apenas por dez minutos. E eu pensei: como? A verdade, no entanto, é que começava a andar e, passado pouco tempo, sentia-me cansado”, recorda o guarda-redes.
Passadas quatro semanas, Iker Casillas iniciou um programa de reabilitação cardíaca com sessões de treino específico e adaptado no Instituto CUF Porto. “São programas multidisciplinares que envolvem vários profissionais, desde logo o cardiologista, que vai fazendo o acompanhamento da evolução da doença, o médico fisiatra, responsável pela avaliação clínico-funcional e pelas sessões de exercício, o nutricionista e o psicólogo”, explica Afonso Rocha, especialista em Medicina Física e Reabilitação que coordenou o programa de reabilitação cardíaca de Iker Casillas. “Os doentes que fazem programas de reabilitação são integrados mais rapidamente na vida normal com maior confiança e com uma estratégia mais adequada de prevenção cardiovascular”, assegura Filipe Macedo.
Uma das componentes centrais do programa de reabilitação cardiovascular é o programa de exercício físico desenhado para a recuperação cardiovascular e funcional. O programa de exercícios tem em conta não apenas as características e gravidade do enfarte sofrido mas também o estado prévio do doente e as suas expectativas para o futuro. “Fazemos uma avaliação clínica exaustiva. Os doentes são avaliados pela Cardiologia e pela área de Reabilitação Cardíaca e fazem uma prova de esforço que dá informações sobre a estabilidade clínica e as respostas fisiológicas em diferentes níveis de intensidade do exercício, a partir da qual retiramos os parâmetros para construir um programa de exercício”, refere Afonso Rocha.
Os treinos incluem sempre treino aeróbico — “um treino de longa duração com intensidade predeterminada em que resulta num aumento da frequência cardíaca e respiratória” — e treino de força. No caso de Iker Casillas, um atleta de alta competição com elevados níveis prévios de capacidade e intensidade cardíaca cujo enfarte não teve critérios de gravidade, a opção recaiu num treino intervalado de alta intensidade. “É uma modalidade muito conhecida na alta competição, que permite atingir níveis de intensidade muito mais elevados. Não é fácil, mas o Iker teve uma evolução muito positiva e chegou a níveis de intensidade compatíveis com os de um atleta com os seus níveis de exigência sem qualquer tipo de preocupação”, garante Afonso Rocha.
O programa foi realizado em articulação com o FC Porto, uma prática comum nestes casos. “Após o primeiro mês, e estando estabelecidos critérios de segurança relativos ao esforço de maior intensidade, começamos a fazer uma ponte com os preparadores físicos do clube para que possam fazer algum complemento das nossas sessões”, explica o especialista, salientando que, nestes momentos, a comunicação entre as duas equipas é fundamental. “Eles fazem monitorização e registos de resposta a diferentes tipos de exercício e nós damos feedback, de modo a potenciar resultados e, progressivamente, transitar alguma da nossa atividade para o clube”, revela Afonso Rocha.
Para Iker Casillas, o tempo custou um pouco mais a passar. “Para quem está habituado a fazer desporto, passar para uma fase em que não se faz quase nada é difícil”, confessa. “Mas o tempo foi passando e fui-me sentindo melhor.” Não obstante, admite que o regresso ao Olival, meses depois, foi um momento agridoce: “Foi emotivo. Estava mais perto de todos os meus colegas, mas não podia fazer o que fazia antes e não me sentia tão confiante.”
Agarrar a vida com as duas mãos
Um ano depois do enfarte sofrido, Iker Casillas segue uma alimentação (ainda mais) saudável do que antes, ganhou gosto pela caminhada e passou a apreciar o descanso e o desporto de menor intensidade. “Sinto-me bem. Gostava de estar a 100%. Gostava de poder voltar a jogar. Mas tenho de estar agradecido porque muitas pessoas não têm a sorte que eu tive”, afirma. “Estou eternamente agradecido tanto aos profissionais da CUF como do FC Porto pelo que se passou naquele dia.”
Filipe Macedo e Afonso Rocha também se congratulam com os resultados obtidos. “Conseguimos atingir todos os objetivos que delineámos, muito por mérito do atleta e da dedicação e motivação que demonstrou”, diz Afonso Rocha. Por sua vez, Filipe Macedo garante que o caso foi “um excelente exemplo do sucesso da medicina atual e da importância do trabalho em equipa”.
Com a saúde recuperada, é altura de pensar no futuro, o que no caso de Iker Casillas passará inevitavelmente pelo futebol, embora talvez em funções distintas: “Penso que se vai fechar uma etapa na minha vida como jogador. Quero continuar ligado ao mundo do futebol, mas não sei ainda de que maneira. Ainda assim, estou convencido de que posso ajudar da melhor maneira que sei, usando a minha experiência de 21 anos como atleta profissional.”
- Nasceu a 20 de maio de 1981, em Móstoles, Espanha
- Estreou-se no Real Madrid com apenas 18 anos, defendendo a baliza do clube espanhol durante 17 temporadas e realizando 725 partidas
- É o atleta mais internacional de sempre pela Seleção Espanhola, conquistando dois Europeus e um Mundial em 167 aparições
- Chegou ao FC Porto em 2015 e, em apenas quatro temporadas, fez mais de 150 jogos