Tratar a obesidade para uma vida ativa

A história de Dora Cruz

Chegou a pesar 117 kg e, como educadora de infância e com um filho de 7 anos, o peso começou a limitar-lhe o dia a dia e a trazer-lhe problemas de saúde. “Sempre fui uma pessoa muito ativa e inicialmente o excesso de peso até nem me privava muito das minhas atividades diárias, mas ao longo do tempo comecei a ter muitas dores nas articulações, principalmente coluna, joelhos, anca, e tinha muito inchaço nos pés e nas pernas.

Quando chegava ao final do dia de trabalho era quase impossível fazer alguma coisa em casa e estava a começar a sentir dificuldade no trabalho que desenvolvia com os miúdos”, recorda, acrescentando: “Quando chegava a casa sentia que não conseguia dar ao meu filho aquilo de que ele precisava e ficava sempre muito cansada com o andar ou ir às compras, ir a um centro comercial. Ficava com um cansaço extremo.”

O processo pós-cirúrgico

O procedimento médico pelo qual Dora passou nada tem que ver com as dietas que fez ao longo da vida. “A cirurgia bariátrica é todo um processo: um processo psicológico, um processo físico, um processo emocional, e com a ajuda de uma equipa multidisciplinar nós conseguimos transformar a nossa vida e conseguimos ser muito mais saudáveis”, afirma.

A cirurgia aconteceu a 17 de dezembro de 2021 e, em suma, diminuiu o volume do estômago de Dora. Mas trouxe-lhe mais do que isso: “Eu ganhei uma reeducação alimentar, deixei de ter aquela fome grande que tinha, porque o meu estômago ficou mais pequeno.”

Depois da cirurgia, Dora perdeu 58 kg em 13 meses, mas é importante notar que a perda de peso não se fez exclusivamente pelo ato cirúrgico. Há um pós-operatório rigoroso e uma equipa multidisciplinar do Hospital CUF Descobertas que acompanha Dora, com grande foco nas especialidades de Nutrição e Psicologia.

testemunho Dora Cruz obesidade_antes

“A nutrição é um pilar importante”

A alimentação depois da cirurgia teve regras que devem ser escrupulosamente cumpridas. “Comecei com uma dieta líquida e a seguir passei para uma dieta pastosa, em que já ingeria alguns purés. Quando passei para a dieta sólida, dieta normal, fui introduzindo os alimentos aos poucos. Ao início era um bocadinho difícil tolerar alimentos mais pesados, como a carne de porco ou carne de vaca, que tinha de ingerir em menores quantidades, mas aos poucos fui conseguindo ingerir de tudo aquilo que faz parte de uma alimentação saudável”, lembra Dora. 

Querer cumprir o rigor das regras também gerou dúvidas sobre que temperos incluir, sobre se todos os ingredientes são permitidos. Foi também neste aspeto que o acompanhamento de um nutricionista se revelou fundamental: “A nutrição é um pilar importante neste sentido. Dá-nos as quantidades, dá-nos dicas de receitas, coisas que até já fazia na minha vida, mas as quantidades agora são muito ajustadas.”

Com o avançar do tempo, ficou mais claro para Dora aquilo que, dentro de uma dieta equilibrada, a faz sentir-se bem ou não. Houve, portanto, a necessidade de ir ajustando o seu plano alimentar em conjunto com o nutricionista. Este caminho levou-a a conseguir comer de tudo em pequenas quantidades, várias vezes ao dia. “Eu acabei por ganhar novos hábitos alimentares ao longo destes meses, o que não quer dizer que por vezes não coma uma batata frita ou não coma um doce, ou um bolo, mas a quantidade é muito pequena”, conta.

“O apoio psicológico ajuda-nos a perceber aquilo que queremos para a nossa vida. Se é isto que eu quero, eu vou ter de batalhar.”

Neste processo há muitas emoções que precisam de ser geridas, além de ser preciso lidar com as privações que o momento pós-cirúrgico impõe. O acompanhamento psicológico foca-se nestas questões e ajudou Dora a encontrar motivação diária. “Ajuda-nos a perceber aquilo que queremos para a nossa vida”, resume, “e, por vezes, até temos as coisas muito assentes e sabemos os objetivos, mas a Psicologia ajuda-nos a encontrar um foco, a perceber que se é isto que eu quero, eu vou ter de batalhar, porque se eu não cumprir estes objetivos certamente não chegarei lá.”

Além de toda a equipa médica, o apoio daqueles que rodeiam todos os dias Dora fora, segundo a própria, fundamentais. “Em casa houve pessoas próximas que até não concordaram muito inicialmente com aquilo que eu estava a fazer, pela preocupação que traz uma cirurgia deste tipo, mas a partir do momento em que eu tomei a decisão fui apoiada a 100 %. Na recuperação foi fundamental o apoio deles. Sempre tentaram perceber como é que eu estava, como é que eu me sentia, se eu estava confortável em estar sentada à mesa ou não. Isso foi fundamental ao longo deste processo e da minha recuperação”, recorda.

Uma nova vida

As consequências que a obesidade estava a ter na vida desta mulher jovem e ativa são passado e o sentimento de Dora é o de uma nova vida. “Eu renasci, consigo fazer todas as atividades, consigo acompanhar todas as pessoas que me rodeiam”, conta. “Esta saúde que eu ganhei traz-me felicidade.”

A qualidade de vida nota-se no dia a dia: “Eu tenho muito mais agilidade, muito mais energia. Não me sinto com necessidade de ir comer, seja um chocolate, um doce, umas batatas fritas. Consigo levantar-me de manhã, fazer a minha rotina, levar o meu filho à escola, ir para o trabalho, ir às compras, fazer refeições em casa e não me canso.”

“Eu renasci, consigo fazer todas as atividades, consigo acompanhar todas as pessoas que me rodeiam. Esta saúde que eu ganhei traz-me felicidade.”

Nesta fase da sua vida, Dora mantém-se nos 58 kg e o acompanhamento médico não terminou com o pós-operatório: “Faço consultas regulares com o cirurgião e com o nutricionista e o objetivo é este mesmo: manter este peso, mantendo saúde. Tenho feito análises para tentar perceber se todos os valores estão dentro da normalidade e vamos ajustando com a cirurgia e com a nutrição aquilo que vai sendo necessário, mas neste momento estou bem e o objetivo é manter este peso.”

Este renascimento e todo o acompanhamento multidisciplinar da doente transformou também a visão de Dora em relação ao seu corpo e, especificamente, ao seu peso. Um passo importante foi compreender a obesidade como uma doença que precisa de ser tratada, como qualquer outra. “A obesidade é uma doença crónica…se nós tivermos hipertensão temos de ser medicados e é para a vida toda. A obesidade foi tratada não com medicação, mas com uma cirurgia e eu tenho que perceber que eu sou uma obesa recuperada. Tenho que encarar isto como uma doença crónica que neste momento está estabilizada”, explica Dora a mudança na sua abordagem à própria doença.

 

Por outro lado, é difícil, assume, lidar com as ideias que a sociedade cria acerca do peso e da obesidade. “Muitas vezes a sociedade também nos impinge que sempre fomos gordos e ‘ah, agora estás magra mas vais voltar a engordar’. Não, não vou. Estou bem e não posso encarar aquilo que a sociedade me dá como um motivo para voltar a engordar, tenho que dizer: ‘não, eu sou persistente, eu estou focada e eu vou manter a minha vida saudável por mim, pelo meu filho e por todos aqueles que me rodeiam”, assume Dora o compromisso.

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A mensagem de Dora

“A todas as pessoas que são obesas: nunca desistam. Eu achava que não tinha critérios para fazer uma cirurgia bariátrica, pensava que se calhar não era suficientemente gorda, mas o certo é que a obesidade estava a limitar o meu dia a dia. Não desistam, porque uma cirurgia bariátrica não é só perder peso, não é ficar magro, ficar mais bonito, mais elegante. Não! Uma cirurgia bariátrica é ganhar vida, é ganhar saúde e foi isto mesmo que eu senti na minha vida. Por isso, não desistam, falem com o vosso cirurgião, falem com o vosso médico, procurem ajuda se não se sentem bem.”

 

Unidade da Obesidade