Quando manter o ritmo é importante

A população masculina tem uma maior propensão para as doenças cardiovasculares, entre elas “a doença coronária, que leva ao desenvolvimento de enfartes, e a fibrilhação auricular, uma arritmia que pode levar à formação de coágulos e tromboses cerebrais”, aponta Ana Lebreiro, Cardiologista no Hospital CUF Porto. As duas doenças são, também, mais frequentes com o avançar da idade, embora “a fibrilhação auricular possa surgir em pessoas jovens e sem outras comorbilidades”, também a doença coronária “pode manifestar-se precocemente, associada, por exemplo, a um fator de risco familiar ou a outros fatores de risco como diabetes, hipertensão ou tabagismo”, explica a cardiologista.

Se há fatores de risco que não se podem modificar, como a idade, o género ou a história familiar, também existem outros que podem ser prevenidos através da adoção de comportamentos promotores de saúde. “Se não fumar, tiver uma vida ativa com exercício moderado a vigoroso – 150 a 300 minutos por semana –, não tiver colesterol alto, e adotar uma alimentação saudável e equilibrada, ao estilo mediterrânico, poderá baixar muito o seu risco pessoal de desenvolver doença coronária ou fibrilhação auricular”, afirma Ana Lebreiro. A crescente consciência dos comportamentos a adotar não tem, contudo, sido suficiente para diminuir a prevalência destas patologias, em especial a fibrilhação auricular, que se estima que, ao longo da vida, venha a afetar uma em cada três pessoas. “O aumento desta arritmia está muito associado ao aumento de fatores de risco como obesidade, apneia do sono ou diabetes”, afirma a médica.

É, por isso, essencial o acompanhamento diferenciado, não só na área da Cardiologia, mas também envolvendo outros médicos, sensibilizados para esta epidemia e para a necessidade de intervenção precoce, nomeadamente através da referenciação para Consultas de Arritmologia, como as que existem na CUF. “Na consulta de arritmologia somos capazes de identificar os doentes que precocemente vão beneficiar de um tratamento de controlo do ritmo, o que passa por tentar reverter a arritmia ou atrasar o seu aparecimento”, explica Ana Lebreiro. A típica forma de evolução da fibrilhação auricular acaba por permitir o seu tratamento atempado, se identificada precocemente.

Ana Lebreiro

“A fibrilhação auricular começa por se manifestar com episódios autolimitados, passando espontaneamente. Podem passar-se anos até surgir um segundo episódio, que já pode obrigar a uma ida à urgência, à toma de medicação ou a uma cardioversão, que é um choque elétrico para repor o ritmo. Estes episódios tornam-se, depois, mais frequentes e vão exigindo medicação antiarrítmica numa base diária, até que nem esta funciona e acaba por ficar em fibrilhação auricular”, explica a cardiologista. “Se atuarmos antes de a arritmia se tornar persistente, podemos evitar ou atrasar a sua instalação. Isso traz muitos benefícios, nomeadamente na melhoria significativa da qualidade de vida.”

Além da medicação, existem atualmente tratamentos capazes de repor o ritmo cardíaco de doentes com arritmias. É o caso do estudo eletrofisiológico, um procedimento minimamente invasivo em que são introduzidos cateteres no coração para estudar os mecanismos da arritmia e tratá-las através de aplicações de radiofrequência (calor) ou através do frio (crio-ablação). “Algumas arritmias, como as taquicardias supraventriculares, em que o coração dispara subitamente, podem ser curadas através da ablação, com estes estudos eletrofisiológicos. Nos casos de fibrilhação auricular, neste momento é o tratamento mais eficaz e aquele que, com ou sem medicação associada, melhor evita o aparecimento de mais episódios de fibrilhação auricular”, explica a médica.

Ana Lebreiro

Os dispositivos eletrónicos implantáveis são outra opção terapêutica para doentes com patologia do foro cardíaco, nomeadamente em casos de doença coronária e má função cardíaca, em que as cicatrizes resultantes do enfarte podem vir a causar arritmias potencialmente fatais. Como explica a médica, nestes casos, pode haver a indicação para colocar um cardioversor-desfibrilador implantado, para prevenir a morte súbita cardíaca. “Mas nem todos os doentes que tiveram um enfarte têm essa indicação”, alerta Ana Lebreiro. Já nos casos em que a parte elétrica do coração começa a falhar, surge a indicação para a colocação de um pacemaker como forma de assegurar o ritmo.

“É um pouco como as artroses. Está relacionado com a idade e com a evolução do nosso organismo: a certa altura, a condução elétrica do coração começa a ficar mais atrasada, ou seja, os impulsos vão percorrendo o coração de uma forma muito lenta, podendo mesmo ficar bloqueados. Em faixas etárias mais avançadas é frequente haver esses problemas elétricos e, por vezes, têm indicação para a colocação do pacemaker”, diz a médica, não deixando de sublinhar que cada caso tem indicadores específicos que têm de ser avaliados em consulta.

 

 

Fotografias de António Pedrosa (4SEE)

 

 

 

António Portulez
Revista +VIDA

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Publicado a 27/04/2023