Fobia social: mais do que timidez

Cérebro e saúde mental
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A fobia social consiste no medo de certas situações sociais, como falar em público, conhecer pessoas ou até ir ao supermercado. Saiba mais sobre este problema.

A ansiedade afeta um em cada seis portugueses, segundo dados da Ordem dos Psicólogos Portugueses. Existem vários tipos de ansiedade, sendo um deles a fobia social.

Mais do que mera timidez, a fobia social (ou ansiedade social) é um transtorno que pode ter um grande impacto na vida de quem dele sofre e cujas causas exatas são ainda desconhecidas. Este problema de saúde mental consiste em sentir medo ou ansiedade que surge em vários tipos de contextos sociais. Pode tratar-se, por exemplo, do medo de ser avaliado de uma forma negativa pelas outras pessoas ou até de ser rejeitado. Pode surgir quando a pessoa tem de falar em público ou simplesmente quando conhece pessoas novas. Quem sofre de fobia social pode ainda ter receio de agir ou parecer ansioso. Como resultado, é frequente que tente evitar situações sociais que impliquem convívio com outras pessoas.

Em média, a fobia social surge durante a adolescência e, muitas vezes, as pessoas que sofrem deste transtorno de saúde mental referem ter tido timidez extrema durante a infância. Para muitas pessoas, a fobia social tende a aliviar com a idade, contudo, há muitas situações em que não melhora sem tratamento adequado.

 

Situações em que pode surgir a fobia social

É normal que qualquer pessoa já tenha sentido em determinados momentos da sua vida que algumas situações sociais a deixaram mais constrangida ou até ansiosa. Habitualmente, esses sentimentos não têm um grande impacto ou acabam por desaparecer e é possível desfrutar do momento causador da ansiedade.

Quem sofre de fobia social pode sentir o surgimento dos sintomas em diferentes situações e contextos sociais, podendo considerar difíceis várias atividades do dia a dia, como:

  • Falar em público
  • Conversar em grupo
  • Iniciar uma conversa
  • Falar ao telemóvel
  • Falar com figuras de autoridade
  • Conhecer pessoas novas
  • Comer e beber em frente a outras pessoas
  • Algumas saídas de casa, por exemplo, para ir ao supermercado
  • Comparecer no local de trabalho

 

Como se manifesta a fobia social

A fobia social pode ter diversos tipos de manifestações, que podem ser divididas em dois grupos:

 

1. Sintomas psicológicos

  • Sentimento de ansiedade relativamente a eventos sociais
  • Medo de fazer “má figura” em frente a outras pessoas
  • Receio de que as outras pessoas percebam que está preocupado
  • Pensar repetidamente em coisas embaraçosas que lhe podem acontecer
  • Ser incapaz de dizer / fazer aquilo que quer
  • Após o evento, sentir preocupação relativamente às suas ações e palavras, pensando inúmeras vezes em tudo o que disse ou fez e que podia ter feito de outra forma

 

2. Sintomas físicos

  • Rubor
  • Gaguez
  • Tremores
  • Náuseas
  • Batimento cardíaco forte
  • Palpitações (sentir que o coração bate de forma irregular)
  • Boca seca
  • Transpiração / suores
  • Necessidade de ir à casa de banho urinar ou defecar
  • Sensação de dormência ou formigueiro nos dedos das mãos / pés

 

Alguns dos sintomas provocados pela fobia social podem ser alarmantes para a pessoa, exacerbando a sua ansiedade. Além disso, apesar de muitas vezes perceber que o seu medo é excessivo, pode continuar a sentir-se impotente face à ansiedade que se manifesta.

 

Comportamentos que podem “alimentar” a fobia social

Os próprios pensamentos ou comportamentos de uma pessoa que sofre de fobia social podem favorecer a sua ansiedade relativamente a uma determinada situação social. Por exemplo, a autoimposição de regras (“tenho de parecer inteligente”); crenças acerca da própria pessoa (“sou aborrecido”); e previsões (“quando me conhecerem, vão perceber que não sou adequado”). Este tipo de pensamentos, que surgem de forma muito automática, fazem com que as pessoas que sofrem de fobia social critiquem os seus comportamentos, levando-as a crer que transmitem determinada imagem a terceiros - habitualmente, pouco agradável -, mesmo quando não se aproxima da perceção real.

Além disso, existem alguns comportamentos defensivos que tendem a adotar, como:

  • Ingerir álcool
  • Não partilhar informações pessoais
  • Evitar contacto visual
  • Fazer demasiadas perguntas à pessoa com quem estão a conversar

 

Um dos problemas deste tipo de comportamentos é que não permitem que a pessoa que sofre de fobia social tenha uma perceção verdadeira da realidade. Por exemplo, impedem-na de perceber que, na verdade, as coisas más que ela pensava que iam acontecer caso não controlasse o seu comportamento, não acontecem.

 

Sabia que...

Quem sofre de fobia social tem maior risco de desenvolver depressão e problemas associados ao consumo de álcool.

 

Impacto na qualidade de vida

A fobia social pode ter um impacto direto na qualidade de vida de quem sofre deste problema e é comum que a pessoa sinta que os outros conseguem facilmente fazer coisas que, para ela, parecem ser impossíveis.

Os sintomas de fobia social podem ser tão graves que acabam por perturbar as rotinas diárias e até as relações pessoais e laborais. Isto acontece, em parte, porque muitas destas pessoas tendem a orientar a sua vida em torno dos sintomas. Assim, por vezes, deixam de fazer coisas que poderiam ser fonte de bem-estar e satisfação. Alguns exemplos concretos são recusar uma oportunidade profissional por envolver interagir frequentemente com pessoas novas ou evitar almoçar / jantar com amigos por receio que as suas mãos tremam durante a refeição. Podem até não conseguir visitar os filhos na escola, ir às compras ou ao dentista.

 

Sabia que...

Aproximadamente metade das pessoas que sofrem de fobia social, sobretudo homens, apresentam dificuldade em manter uma relação amorosa a longo prazo.

 

As várias opções de tratamento

Sabia que, apesar da existência de terapêuticas eficazes, menos de 5 % das pessoas com fobia social procura tratamento no período de um ano após o surgimento dos sintomas iniciais? E que mais de um terço das pessoas reporta sintomas por dez ou mais anos antes de pedir ajuda? Estes são dados que constam do site da Anxiety & Depression Association of America.

Se tem fobia social, é muito importante que procure tratamento, que pode ajudá-lo a gerir melhor os sintomas. Existem várias abordagens (que podem ser adotadas de forma individual ou em conjunto), desde pequenas alterações comportamentais que pode autoimplementar no seu dia a dia, ao tratamento psicológico ou farmacológico acompanhado por um especialista em saúde mental, como um psicólogo ou psiquiatra.

 

1. Estratégias de autoajuda

  • Frequentar um curso de autoconfiança, algo que pode ser especialmente útil para quem é tímido por natureza.
  • Aprender técnicas de relaxamento para implementar em momentos em que se sinta mais ansioso.
  • Anotar por escrito pensamentos que surgem de forma automática sobre si mesmo. Ao escrevê-los, pode tornar-se mais fácil conseguir mudá-los.
  • Em conversas, escutar mais as outras pessoas e prestar menos atenção aos pensamentos que está a ter sobre si mesmo.
  • Focar-se nos cinco sentidos quando começar a sentir-se ansioso em público - o que vê, ouve, sente... -, em vez de se fixar nos seus próprios pensamentos e sensações.
  • Desconstruir situações preocupantes em vários passos. Feito isto, coloque em prática o primeiro passo e aprenda a relaxar enquanto o faz, fazendo as tentativas que forem necessárias. Quando se sentir confortável, avance para o segundo passo e assim por diante.
  • Abandonar comportamentos defensivos de forma gradual, começando por aquele que considerar mais fácil.
  • Tentar perceber o que lhe causa a ansiedade.
  • Praticar falar em público, que pode ser uma boa abordagem para quem sofre de fobia social leve a moderada.
  • Ter um grupo de apoio e pedir ajuda: embora possa ser embaraçoso ou constrangedor admitir que fica ansioso em determinados contextos sociais, contar com o apoio de outras pessoas pode ser reconfortante.
  • Ser paciente. O progresso é feito de forma gradual e, por vezes, dando alguns passos atrás. Não seja demasiado exigente consigo mesmo, aceitando que pode demorar algum tempo até conseguir ultrapassar os sintomas.

 

2. Tratamento psicológico

  • Praticar competências sociais: treinar determinadas competências - por exemplo, iniciar uma conversa com um desconhecido - pode ajudá-lo a sentir-se mais confortável da próxima vez que estiver com pessoas diferentes. Pode, por exemplo, pedir a alguém que o ajude a praticar, conversando consigo, e, por exemplo, filmar essa interação. Assim, pode assistir ao vídeo para ter uma ideia daquilo que está a fazer e também perceber qual é a perspetiva da outra pessoa ao falar consigo.
  • Terapia cognitivo-comportamental: com a educação de pensamentos e sentimentos, esta abordagem ajuda a alterar a perspetiva que as pessoas têm sobre si próprias e, consequentemente, aquela que elas acham que os outros têm. Por exemplo, está a conversar com alguém e ficou sem assunto de conversa? Quem sofre de fobia social, tende a pensar que a culpa é sua. Contudo, é provável que também a outra pessoa não tenha mais nenhum tópico para trazer para a conversa.
  • Autoexposição gradual: é comum que, mesmo que a pessoa esteja ansiosa relativamente a determinado evento, essa ansiedade acabe por ir desaparecendo ao fim de algum tempo. Sujeitar-se àquilo que o assusta, pode ajudá-lo a ultrapassar o medo. Faça uma lista de todas as situações que considera assustadoras, organizando-a de forma crescente (da menos assustadora para a mais assustadora). Comece pela mais fácil e mantenha-se nesse passo até deixar de se sentir ansioso. Só aí deverá passar para o próximo ponto da lista, enfrentando as várias situações uma a uma. Por exemplo, se sente medo de sair em grupos grandes, comece por combinar sair apenas com um amigo, depois com um grupo restrito e, por fim, com um grupo maior ou para um local onde possam estar mais pessoas (como um restaurante ou bar).

 

3. Tratamento medicamentoso

Existem vários tipos de medicamentos que podem ser utilizados em contexto de fobia social, sempre sob prescrição do médico assistente. Habitualmente, a toma de medicação inicia-se quando a abordagem psicológica não produz os efeitos esperados, quando a pessoa está muito deprimida ou em associação ao tratamento psicológico. Podem ser utilizados, por exemplo, medicamentos antidepressivos ou bloqueadores beta - tipo de medicamento que costuma ser utilizado no tratamento da pressão arterial elevada e que em doses baixas pode ajudar a controlar tremores devido à ansiedade e o aumento da frequência cardíaca; pode também ser tomado pouco antes de um encontro com outras pessoas ou antes de falar em público.

 

Fale com o seu médico assistente se...

Perante dúvidas sobre se os seus sintomas se devem a fobia social ou a outro problema de saúde, deve pedir aconselhamento médico. Por exemplo, se sofre de um problema de coração, pode pedir ajuda ao seu médico para diferenciar os sintomas cardíacos daqueles que são provocados pela ansiedade.

Fontes:

Anxiety & Depression Association of America, março de 2022

Cleveland Clinic, março de 2022

Mind, março de 2022

National Health Service, março de 2022

Ordem dos Psicólogos, março de 2022

Royal College of Psychiatrists, março de 2022

Publicado a 09/10/2023